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architexts ISSN 1809-6298

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O projeto para a “Cidade dos Motores” (1945-46) seria construído em Xerém, no Estado do Rio de Janeiro, para ser uma nova cidade industrial moderna, que serviria de modelo para futuras propostas. O presente artigo é produto do doutorado de Alcília Costa

english
The project for the "Cidade dos Motores" (1945-46), which was built in Xerém, Rio de Janeiro: a new modern industrial city, which provide a model for future proposals. This is a product of the Ph.D. of Alcília Costa


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COSTA, Alcilia Afonso de Albuquerque. As contribuições arquitetônicas habitacionais propostas na Cidade dos Motores (1945-46). Town Plannings Associates. Xerém, RJ. Arquitextos, São Paulo, ano 11, n. 124.01, Vitruvius, set. 2010 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/11.124/3575>.>.

Perspectiva da proposta final [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 102]

Este texto é resultado de pesquisa realizada sobre a “Cidade dos Motores”, projetada entre 1945-46 pela TPA/ Town Planning Associates, de propriedade de Paul Lester Weiner, Josep LLuis Sert, Paul Schulz), que desenvolveram um projeto para uma nova cidade industrial a ser implantada em Xerém, no Rio de Janeiro.

O enfoque dado a este trabalho é arquitetônico, valorizando nas observações, análises e reflexões dos aspectos projetuais e gráficos do projeto (planos, plantas, imagens) que expliquem visualmente a proposta, frisando que, as contribuições históricas e urbanísticas entram como suporte para o estudo realizado.

Autores como os catalães Rovira (2000) e Freixa (2005) já se dedicaram a analisar a obra do conterrâneo arquiteto Sert e suas contribuições para a arquitetura e o urbanismo do século XX (1).

Rovira (2) no livro “José Luis Sert. 1901-1983” analisou o processo histórico que desencadeou a elaboração do projeto para a Cidade dos Motores, relatando sobre a participação em um primeiro momento do arquiteto e urbanista Atíllio Correia Lima, que devido a sua morte prematura não pode dar continuidade aos estudos iniciados, e que por tal motivo, o então general responsável pela idéia de implantação deste arrojado empreendimento, Gal. Guedes Muniz, da equipe do presidente Getúlio Vargas, contratou o arquiteto e urbanista Paul Lester Weiner, para que sua empresa, a TPA continuasse desenvolvendo o projeto.

O professor Jaume Freixa (3) também vem se dedicando ao estudo da obra de Sert e lançou em 1997, uma publicação que resgatou a produção arquitetônica e urbanística do arquiteto catalão, contendo dados básicos sobre cada obra. Outras fontes, como o catálogo da exposição ”Sert Arquitetcto en Nueva York” (1997) contribuiu para o entendimento do projeto para a “Cidade dos Motores” e a contextualização deste no conjunto de obras desenvolvidas pela TPA em cidades da América do Sul e Central.

No Brasil, foi realizada dissertação de mestrado por Gimenes (4) que tratou dos eventos e discussões em torno do projeto para a Cidade dos Motores, enfocando a questão histórica e urbanística, sem ressaltar os aspectos arquitetônicos das intervenções tipológicas das unidades habitacionais. Infelizmente, o trabalho ainda não foi publicado. Correia (5), em trabalho apresentado no VII Seminário do DOCOMOMO Brasil divulgou o resultado de investigação que relacionava o plano da cidade operária da F. N. M. de Attílio Correia Lima com os princípios da modernidade.

Contudo, tais trabalhos ainda não haviam se debruçado sobre as intervenções arquitetônicas em si, mas sim, sobre as questões históricas e urbanísticas que envolviam este projeto. Foi através de coleta realizada em revistas da época, especificamente, a publicação francesa L’Architecture d’Aujourd’hui, publicada em 1947(6), que se pode ter acesso aos projetos dos edifícios projetados para aquela Cidade.

Na revista estão publicados os projetos que seriam realizados na primeira etapa, do terceiro e último plano proposto pela TPA, e também, os projetos das instalações da Fábrica dos Motores, que já existia e que havia dado origem à idéia de criação desta nova cidade. Foi através desta importante fonte documental que se pode, finalmente, compreender melhor as propostas arquitetônicas, especificamente, as de tipologias habitacionais propostas, que foram o objeto de estudo desta investigação (7).

Esclarecimentos sobre a origem do projeto: uma cidade industrial como suporte para a Fábrica Nacional de Motores/ FNM

Fotografia da época da área a ser implantada a Cidade dos Motores [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 99]

A Cidade dos Motores estaria implantada em uma região plana entre montanhas e terrenos acidentados, cortada no sentido norte-sul pelo rio Saracuruna e por um braço deste, o rio Mato Grosso, na região da ”baixada fluminense” no Estado do Rio de Janeiro, entre as cidades do Rio de Janeiro e Petrópolis, onde hoje existe o distrito de Xerém, vinculado ao município de Duque de Caxias, distante 50 km da capital, situado na subida de serra fluminense.

Neste local, desde o ano de 1942, em pleno Estado Novo, havia sido implantada a Fábrica Nacional de Motores (FNM), um projeto ambicioso de colonização e desenvolvimento industrial que começou com a produção de motores de aviões para fins militares. À frente deste projeto estava o Brigadeiro General Guedes Muniz que identificava na industrialização a solução para os grandes problemas econômicos e sociais que o país enfrentava. Para que o Brasil vencesse “a miséria em que se debatia” seria preciso que se industrializasse (8).

O projeto de construção deste empreendimento era de grandes dimensões (9) para a época e dispunha de recursos incomuns naquele tempo, e para a implantação da Fábrica Nacional de Motores, na década de 40, o Governo Vargas lançou mão de recursos do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários (IAPI), comprando uma área de cerca de 6 mil hectares, onde seriam construídas três unidades industriais: a Fábrica Nacional de Motores, a Fábrica Nacional de Tratores, e a Fábrica Nacional de Aviões de Transporte.

Para além das preocupações estritamente econômicas, o projeto da FNM refletia também certa utopia industrialista presente no pensamento de Guedes Muniz (10) que procurou a colaboração do arquiteto e urbanista Atíllio Correa Lima, que realizou os primeiros estudos para viabilizar a proposta da nova cidade.

Antecedentes: a proposta urbanística de Atíllio Correa Lima

Atíllio Correa Lima foi o primeiro profissional a ser consultado pelo General Guedes Muniz, para desenvolver o plano urbanístico da Cidade dos Motores, mas que, devido a sua morte prematura, não pode continuar desenvolvendo o trabalho, que foi posteriormente passado para a empresa americana TPA, conforme será visto adiante.

Proposta inicial de Atillio C. Lima [Rovira, 2006, p. 124]

Estudos da TPA para a “Cidade dos Motores” [Rovira, 2006, p. 124]

Em depoimento dado (11) Muniz, aclarou sobre a importância da contribuição de Correa Lima, bem como, sobre a adoção dos princípios do urbanismo modernos difundidos por Le Corbusier em seu livro “la ville radieuse”.

Atíllio Correa Lima convenceu aos militares a adotarem critérios modernos e apresentou uma proposta inicial, na qual a condição topográfica do lugar, em um vale, tendo a área dividida pelo rio Saracuruna vai ser um dos aspectos marcantes para esta proposta, bem como as demais que se seguiram. Considerando tais aspectos, o urbanista propôs um desenho dividido em seis polígonos, que seriam interligados pelo canal e por vias de acesso de veículos.

Conforme, foi citada anteriormente, a morte prematura de Correa Lima, três dias antes de ter dado seu parecer a respeito da Cidade dos Motores para os militares do Governo de Getúlio Vargas, impediu que sua proposta tivesse continuidade, mas, sem dúvida, foi a sua defesa em prol da verticalização da nova cidade que norteou as propostas apresentadas pelos arquitetos Sert e Paul Lester.

Os arquitetos da TPA que atuaram no projeto

Após a morte de Atíllio Correa Lima o Gal. Guedes Muniz manteve contatos com a empresa americana TPA que assumiu o projeto (12). O projeto para a Cidade dos Motores (1945), contratado pelo Governo brasileiro de Getúlio Vargas (13) que estava interessado em investimentos nacionais na área siderúrgica, foi o primeiro projeto desenvolvido pela TPA na América Latina.

Os critérios projetuais seguidos pela TPA eram as doutrinas do urbanismo moderno, com zoneamentos simplificados, classificações viárias e principalmente, a rigidez formal das propostas tipológicas para a moradia (14). Coincidentemente, Sert era nestes anos (1947-56) presidente dos CIAM (Congrès Internationaux d'Architecture Moderne) e, portanto, porta voz das doutrinas ali trabalhadas, buscando aplicar na prática, o discurso que os embasavam.

A TPA, enquanto existiu (1945-1958), realizou na América Latina um grande número de importantes trabalhos na área urbanística como, por exemplo, o projeto para a Cidade dos Motores (1945) no Rio de Janeiro; a nova cidade de Chimbote, no norte do Peru (1948); o projeto para o Plano Diretor de Bogotá, Colômbia (1951-53); as cidades novas, em Venezuela (1950-53), e o Plano piloto de Havana/ Cuba (1955-58).

A proposta da TPA para a Cidade dos Motores

Proposta definitiva de implantação da ”Cidade dos Motores”: observar a importância do rio no traçado, além do zoneamento das áreas industrial e habitacional [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 100]

Foram realizados vários estudos para a elaboração definitiva do projeto da Cidade dos Motores, conforme pode ser constatado na obra de Rovira (15), e baseado na proposta inicial de Atíllio Correa Lima, no que é referente à implantação física da cidade, chegaram-se a uma proposta final. Esta proposta definitiva estava baseada nos princípios da Carta de Atenas, havendo sido seguidos pelos arquitetos e urbanistas Sert e Weiner, membros atuantes dos CIAM e fiéis seguidores corbusierianos.

De acordo com a Carta de Atenas (16), documento extraído do IV CIAM, realizado na cidade grega de Atenas, em 1933, as chaves do urbanismo moderno estavam contidas nas quatro funções fundamentais: habitar, trabalhar, cultivar o corpo e o espírito, e circular. E foram tais princípios que nortearam a proposta a ser implantada na Cidade dos Motores, dando aos arquitetos da TPA a oportunidade de aplicarem na prática os recursos urbanísticos e projetuais da Carta de Atenas, como por exemplo, a busca pela verticalização para que se pudera ter mais área livre, destinada à criação de parques e jardins, a adoção de “zonificação”, entre outros.

Na proposta urbana da Cidade dos Motores, observa-se que os arquitetos seguiram tais exigências a risca, devido principalmente, ao arquiteto Sert desempenhar na época, uma atividade constante e ativa nos quadros dos CIAM, havendo publicado a obra ”Can our cities survives?” (17), que contribuiu para introduzir o pensamento urbano europeu dos congressos sobre modernidade arquitetônica e urbanística nos EUA.

Os autores do projeto dispunham de 100 hectares para acomodar 25.000 habitantes, possuindo assim uma densidade média de 250 habitantes/hectare, índice ideal de acordo com os princípios da Carta de Atenas. Procuraram na intervenção proposta, deixar intactas as colinas verdes concentrando as edificações na parte plana da paisagem, de acordo com o estudo preliminar apresentado por Atíllio Correa Lima, implantando os blocos paralelos à melhor orientação solar e a separação de circulação entre pedestres e automóveis.

Distribuíram a cidade em três zonas distintas: 1) a zona residencial; 2) a zona cívica e de recreação; 3) a zona industrial.

A disposição destas zonas estava subordinada à possibilidade do habitante se locomover a pé de uma área para outra, sendo estimada uma distância de 500m entre zonas. Esta distância foi tomada como base levando em consideração os aspectos climáticos, as distâncias das demais zonas ao centro cívico. O esquema da cidade foi modulado em torno do eixo principal formado pela via leste-oeste, margeado pelos dois lados pelos imóveis residenciais de altura.

As comunicações leste-oeste da cidade são interrompidas pelo canal, mas asseguradas pela construção de quatro pontes em concreto armado previstas no projeto e os limites leste da cidade estavam determinados pelo Rio Mato Grosso, afluente do rio Saracuruna.

Proposta da TPA para a primeira etapa: duas unidades habitacionais e o Centro Cívico [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 103]

Ao analisar o material coletado referente à proposta da Cidade dos Motores observa-se que a equipe da TPA, optou por dividir a execução do projeto em etapas, fato que pode ser comprovado na publicação do mesmo na revista L’Architecture d’Aujourd’hui (18).

Nesta edição, foi publicada a primeira etapa do projeto, material que possibilitou o acesso ao projeto desenvolvido para a etapa que compreendia duas unidades residenciais completas e o Centro Cívico. Aqui, as informações serão referentes especificamente para os edifícios projetados na zona habitacional.

A Zona habitacional: tipologias

Para o estudo das diferentes tipologias habitacionais foram considerados dois aspectos: as condições climáticas locais traduzidas pelas disposições espaciais no que é referente à ventilação e à proteção solar; e as condições demográficas e sociais particulares a uma cidade composta de trabalhadores industriais praticamente isolados de outros centros urbanos.

Foram considerados também, os aspectos de constituição familiar para a criação das tipologias habitacionais: apartamentos para solteiros; e residências para famílias.

Fotografia da maquete da área habitacional com as três tipologias: no primeiro plano, os edifícios de três pavimentos; à direita, o edifício de oito pavimentos e ao fundo, os blocos dormitórios
Foto Anna Wachsmann [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 109]

Na primeira etapa da proposta apresentada para a Cidade dos Motores foram projetadas apenas duas unidades residenciais, estando previsto um total de ocupação de 6.200 habitantes, distribuídos 2.400 deles em edifícios dormitórios de nove pavimentos, 1.200 em edifícios de oito pavimentos e 2.600 em blocos de três andares. Nesta etapa, não foram projetadas as casas unifamiliares, por isso, não foi encontrado material sobre as mesmas nas publicações pesquisadas.

Cada unidade habitacional é dotada de todos os serviços comuns autônomos, tais como escola, lojas, lavanderias, etc. Os edifícios dormitórios ficariam próximo ao centro cívico e com acesso mais próximo da zona industrial (usina), enquanto que os edifícios para famílias ficariam implantados em uma zona mais tranqüila, circundados de área verde. Todos os edifícios seriam construídos seguindo uma modulação de 3.50m que criaria um ritmo geral, e que também, devido à grande diversidade volumétrica, proporcionava uma aparência de unidade visual.

Os apartamentos para solteiros: edifícios dormitórios de nove pavimentos

Os apartamentos para pessoas solteiras, chamados “edifícios- dormitórios” foram projetados em edifícios de altura (barras) compostos de nove pavimentos. Na primeira etapa da proposta foram projetados três edifícios desta tipologia. Cada edifício comportaria 801 pessoas.

Foram implantados próximos ao centro cívico, pois segundo os planejadores, este é o espaço mais freqüentado por este tipo de habitante. Eles estão localizados “fora” das áreas destinadas às famílias, a fim de evitar uma superposição de atividades e de circulação destes dois tipos distintos de moradores.

No pavimento térreo e no primeiro andar estão projetados os quartos para cinco pessoas, que possuem acesso por um corredor através da parte posterior do edifício. Na entrada principal do pavimento térreo foi projetada uma marquise marcada por septos e cobertura inclinada em uma água que valoriza visualmente este espaço, criando um dinamismo na fachada principal.

Esboço da perspectiva do bloco de edifícios dormitórios para solteiros, compostos de nove pavimentos. Observar detalhe da marquise de acesso [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 114]

Fachada posterior e planta baixa dos pavimentos térreo e “tipo” do edifício dormitório de nove pavimentos [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 115]

Nos demais pavimentos, os quartos foram projetados para 1, 2 e 3 pessoas e os acessos são realizados por dois corredores, um frontal e outro, posterior, que correm paralelos às respectivas fachadas. Na distribuição da plantas nos pavimentos, foi criada uma ala de serviços, na qual foi colocada a bateria sanitária com banheiros comunitários, uma área de lavanderia e a colocação de dois elevadores na parte frontal. A escada de acesso aos pavimentos localiza-se no eixo central que divide o bloco em duas “asas”. O hall central dos pavimentos é completamente vazado, permitindo uma ventilação e iluminação natural constante.

A estrutura do edifício seria em concreto armado, sistemática, seguindo uma modulação, e trabalhando com a valorização da mesma, possuindo esta um papel ordenador espacial. Os corrimãos das varandas/ corredores a partir do segundo até o nono pavimento foram detalhados com peça superior de concreto e fechamentos em barras metálicas, proposta que foi projetada também para os demais edifícios residenciais.

Casas para famílias

As residências para famílias foram projetadas seguindo três tipologias: 1) casas isoladas térreas; 2) edifícios multifamiliares de três pavimentos; 3) edifícios multifamiliares de oito pavimentos.

Casas isoladas

Sobre esta tipologia a investigação ora realizada não conseguiu nenhuma informação referente ao projeto.

Edifícios multifamiliares de três pavimentos

Foi criada uma grande variedade de disposições de apartamentos e, portanto, de aspectos de fachadas dentro desta tipologia, evitando assim uma monotonia que poderia ser acarretada pela adoção de um sistema muito rigoroso. Certos edifícios são inteiramente constituídos de apartamentos de um só nível e outros, apresentam solução da planta em duplex.

Esboço da perspectiva do bloco de edifícios de três paviemntos. Observar o jogo neoplástico na composição das fachadas [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 111]

Planta baixa e corte esquemático do bloco de edifícios de três pavimentos. Observar a solução dada às esquadrias [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 111]

Estudo das fachadas do edifício de três pavimentos [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 111]

Edifícios multifamiliares de oito pavimentos

No projeto desenvolvido para a Cidade dos Motores os edifícios de oito andares são compostos de uma variedade de tipologia de 2, 3 e 4 cômodos de um e dois níveis. Estes tipos são agrupados por andares ou por edifícios inteiros, criando duas variantes nas fachadas devido às diferentes formas de disposição das plantas baixas.

Observa-se nestes imóveis do tipo “corredor” o posicionamento da circulação vertical colocada em um volume solto do bloco interligado por uma passarela, que por sua vez, está conectada a um corredor de acesso aos apartamentos.

Tanto estes edifícios como os de três andares apresentam soluções construtivas muito semelhantes àquelas utilizadas pelo arquiteto Sert para o projeto da Casa Bloc (1934-36) projetado no bairro de Sant Andreu em Barcelona (19), em parceria com o arquiteto Josep Torres-Clavé e J.B.Subirama.

Edifício de serviços coletivos para as unidades habitacionais

Cada unidade residencial possuía um edifício destinado aos serviços coletivos que estava ligado aos blocos de apartamentos por passagens cobertas e passarelas e que complementavam o programa de necessidades em relação ás atividades domésticas, que poderiam ser realizadas, de forma comunitária.

Esboço da perspectiva do centro cívico [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 104]

Zoneamento do centro cívico [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 105]

Estes edifícios possuíam dois pavimentos, estando no primeiro pavimento, lojas de serviços cotidianos e oficinas para bicicletas e no pavimento superior, creche, depósitos, lavanderias e área aberta para secagem de roupas.

No que é referente aos critérios projetuais, estes seguiam o tratamento dado aos demais edifícios, possuindo uma modulação presente na planta e na volumetria, estrutura independente, e uso de volume puro trabalhando com planos na sua composição.

Sistemas construtivos propostos

Os arquitetos criaram para as tipologias habitacionais aspectos com possibilidades variadas a fim de evitar a impressão de monotonia produzida pela repetição de fachadas iguais nos volumes existentes. Os sistemas construtivos permitiam criar certa diversidade, tendo este projeto como mérito uma variedade plástica tipológica, não somente em planta, mas volumetricamente.

Sistemas de pré-fabricação de elementos de vedação para as fachadas
Foto Anna Wachsmann [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 110]

Detalhe do elemento vazado a ser usado nas fachadas
Foto Anna Wachsmann [L’Architecture d’Aujourd’Hui, set, 1947, p. 110]

Com a finalidade de reduzir os detalhes construtivos, diminuir o custo do investimento, economizar em transportes e materiais, os arquitetos empregaram vários métodos de pré-fabricação em distintos tipos de paredes, propondo para tanto, três distintos elementos pré-fabricados que foram empregados nas tipologias habitacionais de baixa e alta altura:

1) Paredes com brise-soleil

Com a finalidade de proteger as fachadas oeste e norte dos efeitos da alta insolação foi criado este elemento de transparência standart para a parte exterior, onde cada parede apresenta uma forma curiosa de caixa (em T) medindo 20 cm x 20 cm x 25 cm, funcionando como brises que permitem uma ventilação constante nas paredes dos corredores criando uma ventilação constante e uma entrada filtrada de iluminação.

2) Paredes duplas

Os elementos exteriores são da altura de um pavimento com uma largura de 35 cm e de 25 cm de espessura. Eles são moldados dentro de formas metálicas que formam uma seção em T com a finalidade de reforçar a sua rigidez. Os vãos entre as duas paredes são utilizados para a ventilação contínua e permitem a livre respiração entre muros. As aberturas podem estar livremente dispostas nas caixas pré-fabricadas que vão do solo ao teto.

3) Elementos pivotantes de fechamentos

O elemento pivotante possui diferentes funções e compõe diversos jogos nas fachadas, sendo contrabalançado e criando diferentes inclinações, funcionando como uma espécie de brise – soleil, e em caso de mau tempo e de frio, este elemento poderia ser completamente fechado.

A combinação de tais elementos pré-fabricados nas fachadas acarreta uma riqueza plástica alcançada devido ao jogo de texturas, planos, luz e sombra que estes proporcionam, além das outras vantagens colocadas anteriormente.

Conclusão

O que ficou do projeto para a Cidade dos Motores? Partindo do principio que o projeto estava intrinsecamente vinculado ao sucesso da Fábrica Nacional de Motores/ FNM se pode concluir que o mesmo não teve continuidade devido ao fracasso do Plano Governamental idealizado para o Complexo Industrial a ser criado na região (20). Logo em seguida ao término da Segunda Guerra, a Fábrica foi privatizada passando por vários proprietários durante todos estes anos, pertencendo atualmente, à empresa de fabricação de ônibus CIFERAL.

As empresas privadas que adquiriram a fábrica não tiveram interesse em dar continuidade ao projeto ousado da TPA, optando por soluções mais tradicionais de construção de conjuntos operários, com casas isoladas, em lugar das propostas de “verticalização” sugeridas no projeto moderno de Sert e Lester Weiner.

Os diretivos que deram continuidade à administração privada da fábrica classificavam (21) como “visionários”, “irrealizável”, “megalomaníaco” o projeto proposto pelo Governo de Getulio Vargas.

Assim, no lugar proposto para a implantação da “Cidade dos Motores” foram construídos vários conjuntos operários: ”Santa Lúcia”, “Nossa Senhora das Graças”. Em seguida, surgiram outros, sendo um deles, destinado aos engenheiros que trabalharam na Fábrica. Tais ocupações foram dando origem ao povoado conhecido como Xerém, que atualmente está vinculado ao município de Duque de Caxias, Estado do Rio de Janeiro.

Através de investigações realizadas em páginas de internet sobre Xerém, se pode observar que muitos desconhecem o fato de que ali, naquele lugar, foi projetada uma das melhores propostas urbanísticas e arquitetônicas daqueles anos da modernidade, de autoria de profissionais como Josep Sert e Paul Lester Weiner, apresentando soluções inéditas e ousadas para aquela época.

Desta maneira, este trabalho pretende retomar a discussão deste projeto nos meios acadêmicos e científicos brasileiros e suas importantes contribuições no campo de propostas arquitetônicas e urbanísticas, observando-se de que maneira, podem ser extraídas contribuições importantes e reaproveitáveis para a contemporaneidade.

notas

1
Vários autores, principalmente catalãs, se dedicaram a estudar a obra do conterrâneo Josep LLuis Sert, destacando-se aqui as publicações pesquisadas sobre o arquiteto: BASTLUND, Knud. José Lluis Sert. Zurich,1967; FREIXA, Jaume. Josep LL. Sert. Barcelona, Gustavo Gili, 4ª Edición, 1995. FREIXA, Jaume. Josep LLuis Sert. Clásicos del Diseno. Vol. 8. Barcelona, Santa & Cole, 1ª Edición, 2005; ROVIRA, Josep. José Luis Sert. 1901-1983. Milano, Electra, 2000; ROVIRA, Josep; Et al. Sert 1928-1979. Half a century of architecture. Complete Work. Barcelona, Fundació Juan MIró, 2005.

2
ROVIRA, Josep. José Luis Sert. 1901-1983. Op. cit., p. 113-127.

3
Ver os textos acima citados de Jaume Freixa.

4
GIMENES, Francisco Carlos. A Cidade dos Motores. Três Projetos. Dissertação de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo. São Carlos, EESC, 1998.

A pesquisa realizada por Gimenes trata dos eventos e discussões em torno do projeto para a Cidade dos Motores, cidade que sediaria a Fábrica Nacional de Motores - FNM, indústria estratégica no Brasil do Estado Novo. O período compreende principalmente a década de 1940, onde a idéia foi concebida e discutida. Ocupa-se da sistematização de material documental com vistas a permitir sua inclusão no rol de objetos da historiografia de Arquitetura e Urbanismo no Brasil e foi orientada pelo prof.Dr. Carlos A. Ferreira Martins.

5
CORREIA, Telma de Barros. “O modernismo e o núcleo fabril: o plano da cidade operária da F.N.M. de Attílio Correia Lima”, In: http://www.docomomo.org.br/seminario%203%20pdfs/subtema_A1F/Telma_correia.pdf

6
“Plan for Cidade dos Motores, 1945. Rio de Janeiro”, L’Architecture d’aujourd’hui. Paris, Set, 1947, p. 98-120.

O projeto para a “Cidade dos Motores” também foi publicado na revista “Progressive Architecture” em setembro de 1946, e em 1947 foi incluído na exposição “Two Cities” do Museu de Arte Moderna de nova Yorque/ MOMA juntamente com os projetos de Gropius para um bairro em Chicago. Depois da temporada no MOMA, a exposição percorreu várias cidades dos EUA, se prolongando até o ano seguinte.

7
Como resultado desta investigação, foi apresentado pela autora, um trabalho durante o VIII Seminário do DOCOMOMO Brasil, intitulado “Um modelo de cidade moderna industrial: A Cidade dos Motores. Xerém. RJ. TPA/ Town Plannings Associates. 1945- 46”.

8
MUNIZ, Antônio Guedes. “Relatório ao ministro da Viação e Obras Públicas”. 20 de janeiro de 1947. Arquivo Guedes Muniz. In: http://www.museutec.org.br/resgatememoria2002/old/enciclop/cap002/032.html

9
ROVIRA, Josep. Et al. Op. cit., p. 115.

10
MUNIZ, Antônio Guedes. Op. cit.

11
BONDUKI, Nabil. Origens da habitação social no Brasil. São Paulo, Estação Liberdade, 2004, p.141.

12
Em 1945, em Nova Yorque, os arquitetos Josep Lluis Sert (1901-1983), Paul Lester Weiner (1898-1967) e Paul Schulz haviam se associado e criaram a TPA (Town Plannings Associates), empresa voltada para o desenvolvimento de planos urbanísticos e projetos arquitetônicos em países latino-americanos, trabalhando em conjunto com profissionais dos países que contratavam seus serviços.

13
FREIXA, Jaume. Josep LL. Sert. Op. cit., p. 54.

14
ROVIRA, Josep. José Luis Sert. 1901-1983. Op. cit., p. 113-127.

15
ROVIRA, Josep. Et al. Sert. 1928-1979. Half a century of architecture. Complete Work. Op. cit., p. 19.

16
LE CORBUSIER. Principios do Urbanismo (La Carta de Atenas). Barcelona, Editorial Ariel S.A., 1989.

17
SERT, José L. Can our cities survive? An ABC of urban problems, their analysis, their solutions. Cambridge, The Harvard University Press, 1947.

Esta obra de Sert é uma versão da “Carta de Atenas”, escrita em inglês e para o público americano: é um manifesto à cidade funcional, e que foi publicada um ano antes de “La Carta de Atenas” escrita por Le Corbusier.

18
“Plan for Cidade dos Motores. 1945. Rio de Janeiro”, Op. cit., p. 98-120.

19
NOGUERA, Andreu Solano i. Evolució i anàlisis de l’habitatge col.lectiu em l’obra de Josep Lluis Sert. Doutorado em proeyctos arquitectonicos. ETSAB/UPC, 2008.

O projeto da Casa Bloc em Barcelona é composto de duzentos e sete apartamentos tipo duplex com uma generosa área verde. As cobertas eram planas e acessíveis e utilizadas como terraços de convívio e recreação. Os núcleos de circulação vertical, como escadas e elevadores se situam na esquinas dos blocos, proporcionando uma diminuição de ruídos nos apartamentos, além de reforçar visualmente os ângulos do edifício, evitando a aparência de blocos soltos. As casas gozam de ventilação transversal e vistas para ambos os lados. No ano anterior,em 1933, Sert havia participado do 4º CIAM, em Atenas, e tenta neste projeto, experimentar como primeira oportunidade de realizar um exercício de habitação coletiva para por em prática todas as teorias modernas que defendia com veemência junto com seus colegas que participaram do GATPAC. Dessa forma, apresentava neste projeto para a Casa Bloc uma nova forma de viver e de atuar em uma cidade moderna.

20
FIGUEIRA, Archibaldo. “Casas da FNM têm aumento de 1 mil por cento”. Disponível em http://www.anovademocracia.com.br/no-26/616-casas-da-fnm-tem-aumento-de-1-mil-por-cento. Acesso em 12 de dezembro de 2008.

21
Idem.

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Raquel Mendes de Freitas, Regina Sueiro de Figueiredo, Celso Correia de Souza and Ademir Kleber Morbeck de Oliveira

124.11

Sistemas urbanos

el estado de la cuestión y los ecosistemas como laboratorio

Glenda Dimuro Peter

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